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Dzubucuá é a 2ª língua indígena reconhecida oficialmente por uma cidade no Ceará

Movimento faz parte de reconhecimento e luta pela afirmação de povos originários no Estado

por gazetalitoranea.com.br
15 visualizações Nicolas Paulino/Diário do Nordeste
Dzubucuá é a 2ª língua indígena reconhecida oficialmente por uma cidade no Ceará

A cidade de Crateús, no interior do Ceará, viveu um marco histórico na última quinta-feira (28/08). Em sessão na Câmara Municipal, foi aprovado por unanimidade o Projeto de Lei que reconhece a Língua Dzubucuá, do povo Kariri, como língua cooficial do município. É o segundo dispositivo do tipo aceito no Estado.

Com a aprovação, a língua Dzubucuá passa a ser a primeira Língua Indígena reconhecida de Crateús e a segunda reconhecida no Estado do Ceará. A primeira foi no município de Monsenhor Tabosa, também no Sertão de Crateús, há quatro anos.

Para a Associação Kariri, essa é uma “conquista que fortalece nossa identidade, valoriza nossa história e garante que a voz ancestral do povo Kariri siga ecoando com dignidade”. Indígenas da etnia lotaram a Câmara, entoaram cânticos e exibiram cartazes como “Nossa língua não está morta”.

Segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Crateús tem uma população de 3.733 indígenas, distribuídos nas etnias Kariri, Tabajara, Kalabaça, Potyguara, Tupinambá, Jenipapo-Kanindé e Guarany.

Com a regulamentação, os indígenas poderão, de maneira oficial, usar a língua em documentos, provas, estruturas pedagógicas e todo e qualquer documento oficial das escolas. É o que explica a autora da proposta, a vereadora Professora Amélia (PCdoB).

“Com isso, é natural que haja uma ampliação, uma vez que, dessa forma, legalizamos esta utilização antes inexistente”, considera. Para a parlamentar, o dispositivo reforça o respeito à comunidade originária, que “durante muitos anos teve sua identidade escondida porque as políticas públicas que existiam eram deficitárias”.

“Mais do que um reconhecimento legal, este é um ato de resistência, de afirmação cultural e de esperança para as novas gerações”, acrescenta a Associação Kariri. “A língua é memória, é luta, é vida! Que este momento histórico fortaleça não apenas o povo Kariri, mas todas as comunidades que seguem firmes na preservação de suas línguas e tradições”.

Após a aprovação na Câmara, o projeto segue para sanção da prefeita Janaína Farias.

Processo de pesquisa

Segundo o educador e produtor cultural Lucas Kariri Sipya, residente na Aldeia Maratoan, a retomada da língua ocorreu depois que ele iniciou a graduação em História e se viu provocado pela origem da língua materna de seu povo.

“Eu sempre coloquei para nossa comunidade que a nossa língua nunca foi extinta, mas sim silenciada. E aí, começamos a conversar, a estudar livros, dicionários antigos”, conta. Nesse processo, tiveram ajuda do professor Valdivino José de Lima Neto, especialista em etnologia indígena.

Durante as pesquisas, eles também contaram com o apoio de Idiane Kariri-Xocó, de Alagoas, uma guardiã da língua Dzubukua-Kipeá – outra língua da mesma nação Kariri. Ela chegou a visitar a aldeia cearense para trocar conhecimentos e experiências.

Assim, a comunidade já cultivou alguns formadores na língua, já utilizada pelos Kariri de Maratoan no dia a dia, principalmente na musicalidade. “A gente começa a trabalhar a língua a partir da educação infantil, com as crianças. Elas começam a se alfabetizar a partir da musicalidade. Hoje, já temos 15 músicas feitas por elas”, conta Lucas.

Atualmente, está em construção no território a Oca dos Saberes, que será uma mescla de centro de pesquisa, Laboratório da Língua Dzbucuá Kariri e um equipamento cultural.

O que é Dzubukuá?

O Dzubukuá ou Karirí é um língua que, juntamente com o Kipeá (Kirirí), o Sabuyá e o Kamurú (Pedra Branca), integram a família linguística Karirí. Era uma língua falada pelos indígenas Karirí-Dzubukuá que povoaram o sertão nordestino, sobretudo da Bahia ao Piauí.

As informações são da tese “Um estudo gramatical da língua Dzubukuá, família Karirí”, do linguista José Márcio Correia de Queiroz, apresentado ao Doutorado em Linguística e Ensino da Universidade Federal da Paraí­ba (UFPB).

Segundo o pesquisador, esse é um exemplo de língua polissintética, ou seja, que apresenta estruturas léxico-gramaticais complexas, reunindo em um só vocábulo diferentes conceitos. Na Língua Portuguesa, por exemplo, esse entendimento só poderia ser expresso por meio de uma sentença inteira.

Apesar da história, poucos estudos se dedicam ao Dzubukuá. Até o momento, as únicas fontes primárias dessa língua estão num catecismo impresso e no manuscrito, ambos de autoria do capuchinho francês Bernardo de Nantes, no início do século XVIII.

Eles representam documentos históricos e etnolinguísticos que retratam a língua e parte dos costumes, crenças e comportamentos dos indígenas Kariri.

Monsenhor Tabosa foi pioneira

O município de Monsenhor Tabosa foi o primeiro do Nordeste a reconhecer a língua Tupi-nheengatu como cooficial da cidade, em maio de 2021. A língua é falada pelos povos Potiguara, Tabajara, Gavião e Tubiba-Tapuia daquela região.

Com a lei, a língua deve ter seu ensino instituído nas escolas da rede municipal e outros programas comunitários. Isso pode contribuir para que outras gerações sigam aprendendo o idioma, pertencente à família de línguas Tupi-Guarani.

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